The Endless Larira…
Era uma noite tipicamente Quintonêsa. Muita música rolando em cada esquina fervilhante, olhares sedentos trocados por todos os lados, anunciando amores de verão chegando. Todos se divertiam, riam, falavam, seduziam… Todos não… Ele não…
O Tio Feito, figura lendária do Quintão, estava em seu tradicional ponto, no meio de um quarteirão movimentado da mais importante avenida da praia. A fila à sua porta já dava uma volta na quadra, como em todas as noites. Ele tagarelava com seus clientes enquanto balançava suas espátulas e batucava a chapa onde fabricava os mais deliciosos crepes dos quais já se ouvira falar, sempre embalado por uma canção que tocava apenas dentro de sua amalucada cabecinha. Entre uma batucada e uma balançada ele questionava o próximo cliente com sua inigualável voz de ébrio habitual: “- E aí maninho, qual vai ser a Larira?”
Sim, Larira. Para alguém que nunca esteve nesta parte remota do litoral gaúcho pode ser desconhecida, mas a palavra é como um coringa, um camaleão linguistico, tomando sempre a forma desejada pelo interlocutor. Neste caso “larira” queria dizer crepe ou sabor, mas poderia ser qualquer coisa!
Invariavelmente depois desta questão, a resposta era uma combinação das mais inusitadas… “-Pô Feito, hoje eu vou de calabreza no meio, banana e esticadinho nas pontas”; ou então “- Aí Feito, me vê um de cebola nas pontas e maçã com calda de abacate no meio”, ou outra loucura alimentícia do gênero.
Mas naquela noite, quando o tio Feito disparou sua questão típica ouviu uma resposta estranha: “-Bah Tio Feito não sei… A Larira tá estranha, não tô pegando ninguém, elas não tão me olhando de jeito nenhum, já tentei as altas, as baixas, as roqueiras, as chinelas e nem as funkeirinhas do Chafa querem a minha Larira!”
O tio Feito ouviu aquilo e subitamente ficou ereto como que em transe, afetado por aquela falta de Larira do menino. Depois de alguns segundos de estranha sobriedade voltou ao seu gingado, e gingando e batendo as espátulas questionou:
“- Maninho, tu quer um remédio pra essa tua larira??”
Ao que o garoto respondeu: “-Claro tio Feito! Essa larira tá demais!”
Então o tio feito batucou suas espátulas como se fosse um pai de santo com seus patuás e declarou: “-Pra acabar com essa Larira, maninho, só uma larira que eu tenho aqui, vou fazer pra ti a Trinca do Amor! Bah maninho, vai ser uma Larira!”
Então ele jogou na chapa a massa de crepe exalou seus maravilhosos odores ao entrar em contato com o calor daquele aço. Em seguida buscou os ingredientes com a ginga de um Mestre Sala da Mangueira e a precisão cirúrgica do Pitangui! – Da geladeira veio o esticadinho:”- Isso aqui maninho, não pode ficar fora da Larira.” Saltou como um gafanhoto, e de um armário cheio de cupins veio o chocolate branco: “-Os cupins dão um sabor especial pra essa Larira!” Deu uma cambalhota no chão terroso e de uma gaveta totalmente enferrujada veio o chocolate preto: “ –Essa Larira veio direto da Suiça, tem que deixar bem no fundinho da Larira, porque ele não gosta de Sol.”
Papo vai, papo vem… O crepe ficou pronto e o Tio Feito ao entregar o alimento mágico soltou uma frase como se fosse uma premonição: “ –Tá ae maninho… Só tem uma coisa Roberto: Toma cuidado… Quando tu pede uma Larira, tu pode conseguir… … … E me paga os 2,50!”
E assim iniciou mais um verão na Quintonésia. Esperem pelos próximos capítulos que pode aparecer amanhã! Ou semana que vem. Ou na outra!